segunda-feira, 12 de abril de 2010

Oxalá Leituras


Chegando ao reino do seu filho, Oxalá, todo sujo, é confundido com um bandido e é jogado na prisão por sete anos. Neste tempo, o reino de Xangô enfrenta muitos problemas e um babalaô lhe diz que o reino passa por tantas adversidades porque o rei compactua com injustiças. Xangô vai então às prisões para averiguar se há injustiças e descobre entre os presos o próprio pai. Triste, coloca o velho pai em suas próprias costas e o conduz ao palácio onde ele mesmo se encarrega de banhá-lo e vestí-lo com as roupas mais brancas que existem, realizando a seguir uma grande festa em sua homenagem. A festa das Águas de Oxalá, com uma procissão representando a viagem de Oxalá, rememora este episódio.

Como todo mito, este também é simbólico e aberto. Não é respeitoso reduzir um fato acreditado em uma religião a pura lenda. Todo mito é mais do que lenda. Independentemente da sua veracidade histórica, esta visita de Oxalá a Xangô significa que a justiça divina (Xangô) liberta a bondade providencial do Criador (Oxalá) que vem sobre o mundo como águas benfazejas da primavera. A volta das chuvas da primavera representa esta visita nova e renovadora do amor à justiça. De um modo ou de outro, todas as religiões contam histórias para mostrar o que diz o salmo 85: "a justiça e a paz, a verdade e o amor têm de se encontrar e se abraçar".

Mais do que nunca a humanidade precisa de uma grande festa das águas. Todos os anos, especialistas de 140 países se reúnem na Suécia para a Semana Mundial da Água. A cada ano, estes estudiosos constatam ser mais grave a carência de água no planeta Terra. Neste ano, este encontro ocorreu de 20 a 26 de agosto e reiterou que um terço da população mundial já sofre com a escassez de água potável. Isso é ainda mais grave porque este quadro era previsto somente para 2025 e já está acontecendo em 2006. De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), a cada ano, cerca de 2, 2 milhões de pessoas, muitas delas crianças, morrem em razão da falta d´água e de suas conseqüências.

Esta crise de água, explicável pela má distribuição dos rios e lagos na superfície terrestre, é agravada pelo aquecimento global e pela devastação de áreas úmidas, mas principalmente pelo desperdício e pela má gestão dos recursos hídricos, termo impróprio, já que água não é mercadoria para ser recurso. Água é um bem da natureza que está no planeta há bilhões de anos. É o ambiente onde surgiu a vida e componente de cada ser vivo. Por isso, o supremo valor da água é o biológico. Recurso hídrico é a parcela da água usada pelos seres humanos para alguma atividade, principalmente econômica. Portanto, água é um conceito muito mais amplo que recurso hídrico, embora sejam indissociáveis.

A questão é que o uso da água hoje é muito mais intenso que em algumas décadas atrás. Hoje, a média mundial é que da água doce utilizada, 70% destinam-se para agricultura, 20% para indústria e 10% para o consumo humano. Esse uso intenso da água, principalmente na agricultura e na indústria, ocorre num ritmo mais acelerado que a reposição feita pelo ciclo natural das águas. Dessa forma, muitos mananciais estão sendo eliminados pelo sobre uso que deles se faz. Pior, ao devolver a água para seu ciclo natural, ela vem contaminada pelos agrotóxicos da agricultura e pela química da indústria. A falta de saneamento ambiental, sobretudo em países pobres, colabora para a contaminação dos mananciais.

A festa das Águas de Oxalá é realizada em bairros de periferia, nos quais nem sempre o acesso à água é fácil. É uma profecia espiritual que indica ao mundo que a solução para a crise da água não pode ser a mercantilização nem a privatização. Que toda a humanidade se coloque como as filhas e filhos de santo na procissão de Oxalá, carregando cada pessoa o seu recipiente de água para colocar em comum com todos. Água é direito humano universal e só quando é posta em comum pode ser fonte de vida e de bênçãos para todo ser vivo.

 
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